Por Terras de Atros – A Lei do Equilíbrio Celeste (Parte II)




Depois de no dia anterior ter estado com Terardo, hoje era dia de escalar o Monte Sheng, o ponto mais alto e inacessível de Atros. Para lá chegar teríamos de ultrapassar os Pântanos de Manang e subir as vertiginosas escarpas de Montay. O nosso objetivo passava por conhecer o Templo do Ninho da Grande Águia Sagrada. Reza a lenda que mal entendida pelos homens, face à sua enorme e inexplicável figura, a Grande Águia Sagrada fugiu para o Monte Sheng e construiu ai o seu ninho. 

Todos os anos vários Mestres Aprendizes fazem-se conduzir ao velho templo e partilham histórias. O templo é uma espécie de entreposto onde se cruzam Mestres de todas as descendências e proveniências em busca de uma partilha de saber que os complemente ou permita responder a velhas perguntas que perturbam as suas mentes inquietas. Outros, como eu, procuram o templo só para aprender mas, como sempre, tento esvaziar o copo pois nunca se sabe o que pode acontecer. 

Primeiro deixem-me fascinar pelos incríveis precipícios do Monte Sheng que se entendiam desde a muralha oeste até à muralha norte. Pensei para mim mesmo como os havia subido. Depois desloquei-me para a ala sul e juntei-me a outros mestres que silenciosamente ouviam Mestre Zulu. Este partilhava parte da sua doutrina: 

“Valerá a pena encher a taça até transbordar? É mais prudente que te detenhas antes. Não afies demasiado a tua espada ou ela acabará por se inutilizar cedo demais. Se te vangloriares de honras e riquezas, atrairás sobre o que és o infortúnio. Não te preocupes em armazenares todo o ouro que poderes porque nunca serás capaz de o defender. Retira-te quando sentires que o teu trabalho acabou. Esta é a Lei do Equilíbrio Celeste.” 

Prestei muita atenção a estas palavras e no fim questionei Zulu: 

- Mestre, se me permites a pergunta. Quando é que percebemos que o copo estás prestes a transbordar, que a espada está demasiado afiada ou que é tempo de retirada porque a nossa demanda está cumprida? Acredito que cada um obedece e faz-se valer num tempo completamente diferente do outro. 

- Meu novo amigo. Lembra-te que os grandes conflitos, os grandes desastres e os fundamentalismos são todos eles fruto de uma suposta ausência de limites. Por outras palavras, o que era já não chegava, o que a todos servia para alguns era sinal de apatia e fraqueza. O homem a determinada altura esqueceu-se de uma lição básica. Há sempre um momento para parar, pausar e pensar para poder voltar a decidir. Tanto quem decide como quem cumpre o decidido tem de parar para perceber o que está a decidir ou a cumprir. Quantos conflitos, imbecilidades e extremismos vazios teriam sido evitados pelo simples ato de parar, pausar e pensar para poder voltar a decidir? Este ato, meu novo amigo, é a Lei do Equilíbrio Celeste.