Vejo através dos olhos do meu pai e da minha mãe... - Diários de Ethérnia - Parte VII


Tinha partido numa viagem impossível rumo ao cume dos Pilares de Gaia, a montanha que ninguém ousa escalar. Chegado ao seu topo foi um momento de paragem. Sentem-me em posição de Lotus, fechei os olhos, senti os elementos a ligarem-me à montanha e deixei-me ir no meu próprio silêncio. Naquele momento parti para junto dos coração da minha mãe e do meu pai. Nesse momento reli em pensamento o legado que o meu pai e minha mãe me haviam proporcionado.

O meu pai é um velho sábio que se rege pelos ensinamentos da Velha Ordem do Livro dos Elementos. A Velha Ordem foi o primeiro grupo de Mestres que redigiu a sangue o primeiro original do Livro dos Elementos e que deu origem, segundo as antigas lendas, ao início da Nova Era.

É um filósofo e líder de Clã. As pessoas recorrem a ele em busca de aconselhamento espiritual e de mediação para os pequenos desacatos do dia a dia que ocorrem na nossa comunidade. A minha mãe é uma Líder Profateri. As Líderes Profateri são as matriarcas do Clã que têm a responsabilidade de educar as crianças até às suas dez épocas anuais. 

Em pequeno fui educado no meio de centenas de outras crianças como eu, não só pelas responsabilidades que a minha mãe desempenhava mas porque fui ensinado pelos meus progenitores que a vida é feita na construção de laços entre os que nos são semelhantes, numa partilha permanente de saberes e liberdades. O meu pai dizia sempre “Não peças aquilo que não estás disposto a dar…”.

A minha mãe, por outro lado, ensinou-me a seguir o coração, a não ter medo de arriscar, a quebrar as regras sempre que estas eram absurdas, a ir além do que eu achava ser capaz, deu azo à minha loucura quando decidi que queria ser um Mestre Cavaleiro, profetizou-me que tinha de estar disposto a renunciar à minha liberdade quando o mundo assim o exigisse. 

No meu tempo, como acho que assim o foi no tempo de todos, a nossa família determina as linhas do nosso tempo, ajuda-nos a perceber qual é o nosso legado e dá-nos o conforto do refúgio eterno, mesmo depois do seu tempo ter passado.

Mizegui Takasugui, meu velho amigo de aventuras inimagináveis, disse-me um dia sobre a sua família já ausente no tempo dos vivos:

- Nunca estou sozinho, sempre que sonho o meu pai e a minha mãe não me deixam que eu me perca na minha tormenta. Sempre que estou acordado é só olhar o horizonte, os seus olhos continuam a ver através dos meus…