Treina para o momento pelo qual nunca quererás passar... - Diários dos Universos Paralelos - Parte V


Era o meu último dia em Dorey e aquele para o qual tinha guardado a derradeira prova. Fazer a Travessia, ligar-me aos Universos Paralelos, através do elemento fogo. Eu era o Mestre Dragão de Fogo, o fogo era o meu elemento nuclear 

Para esta última etapa de aprendizagem Mestre Joberto levou-me até ao Templo dos Iluminados, bem no coração de Dorey, onde todos os Mestres da Ordem dos Cavaleiros do Poder procuram entender a sua natureza benigna junto da Chama Eterna, situada no centro do Templo. 

O nome era literal, a chama nunca se apagava. Joberto explicou-me que era a única chama conhecida em toda a realidade visível que se permitia a ser tocada sem inflamar a mão humana. Quando tocada a sua cor mudava de acordo com as intenções de quem se predispunha perante ela. O que cada cor significava, fica para outras histórias. 

Para fazer a Travessia através do elemento fogo, como nos outros elementos, esta tinha de ser feita junto do mesmo. Em vez de uma banal fogueira, Joberto queria que eu experimentasse algo que me marcasse para a vida. 

Mais uma vez esperamos que o Sol de pusesse e que o Templo ficasse vazio. Hoje seria Joberto a liderar a Travessia. 

O nosso objetivo seria conhecer Freire, Grande Mestre das Artes da Adivinhação e já desparecido à muitas épocas anuais. Os ensinamentos de Freire ecoaram pelo tempo e eram a raiz para os ensinamentos que todos os Mestres aprendiam quando pretendiam dominar as Artes Milenares da Adivinhação. Não pretendíamos descobrir nada em concreto, apenas conhecer o contexto em que viveu o Mentor que tanto admirávamos. Desta forma aprenderia finalmente a dominar a Travessia através dos 4 elementos. Só me faltava o fogo. 

Já sem ninguém no Templo além de nós, aproximamo-nos da Chama Eterna, fechamos os olhos, entramos em modo de meditação, esticamos as mãos sobre a chama e viajamos. 

Surgimos perante um círculo de aprendizes que ouviam atentamente Freire numa colina enquanto o Sol nascia. Entre todos um aprendiz perguntou: 

-Mestre, treino, treino, foco-me, concentro-me, procuro a paz do momento, mas o meu coração, a necessidade do nível seguinte, a vontade incontrolável de conquistar a próxima montanha paralisaram a minha capacidade de entender o momento, saborear o instante e dessa forma caminhar menos sozinho. O que faço? Estou no caminho que deveria? 

A resposta de Freire foi inesperada: 

- Nunca será o tamanho da batalha que conta, nunca será a proporção da guerra, não é o momento... É a forma como o encaras. Enquanto um se lamentar, agradece. Quando te lembrarem todas as tuas sombras, confronta-os com as tuas bênçãos. Não sei se a velocidade a que vais é a que fará feliz ou que te fará encontrar a liberdade, mas… sendo que nunca serás capaz de determinar o destino, podes sempre treinar o teu coração para o cenário que nunca queres que surja. Treina para o momento pelo qual nunca quererás passar. 

Nesse momento lembrei-me da minha própria vontade desmedida e incontrolável. Joberto sorriu. Sabia que ambos, naquele momento, pensávamos o mesmo. 

Estava na hora de voltar, o nosso tempo ali tinha terminado. Ouvir e ver ao vivo Freire tinha sido um privilégio e eu, finalmente, dominava o poder da Travessia através dos 4 elementos. Os meus dias em Dorey tinham chegado ao fim, estava na hora de voltar ao mundo das mulheres e homens tangíveis.