"A forma como passaste por entre a Tempestade..." - Diários do Silêncio - Parte III

 

Por estes dias estava em retiro em Fornos de Pentatauro, bem nas margens do Mar de Atlante.

Nos dias anteriores havia dedicado o meu tempo à leitura, retiro e meditação tendo como pano de mundo velhas lendas do meu passado. Eram dias que havia escolhido para me dedicar ao meu silêncio, mas estes estavam a chegar ao fim. Mestre Ant Elael, em tempos, ensinou-me que o nosso tempo de silêncio deve ser pausado e finito. Fez-me perceber que este só faz sentido se nos preparar para a mais severa e ruidosa das tempestades. Lembrou-me que era no silêncio que nos reequilibrávamos para o desnível seguinte. 

Nessa tarde, em frente ao Mar de Atlante, antes de partir, convidei Lucy, minha aprendiz, para meditar comigo. O mar, lentamente, começou a irradiar-se de ira. A paz reluzente deu forma à tempestade ruidosa. Procuramos abrigo no sopé de uma rocha e deixamo-nos ficar perante aquele colossal espetáculo. No meio daquele palco vivo Lucy questionou-me:

- Mestre, depois de tanto treino, como é quando tudo o que somos não chega para vencer a tempestade?

- É uma pergunta perigosa a que colocas. Como no caminho para encontramos o nosso silêncio, não importa só ser capaz de vencer a tempestade. Importa a forma como fizemos a passagem e o estado em que chegamos ao lado de lá. Pouco importa que tenhas sido capaz de vencer a maior das tempestades, se perderes o animo e o coração para a paz que se segue.