A diferença entre enriquecer e acumular - Diários da Terra de Ninguém - Parte II



Terceiro dia por Lublia, Terras de Ninguém. Hoje Tito (nosso anfitrião) convidou-nos a visitar Postana, as grande cavernas do Norte, conhecidas como as maiores grutas dos territórios conhecidos.

Conhecer Postana é entrar num universo alternativo, numa experiência de negritude, de busca dos sentidos mais primitivos. Visitar Postana significa entrar na cidade da noite. Em muitos locais é impossível usar tochas para iluminar o caminho devido à humidade extrema.

Em Postana vivia a velha tribo dos Bled, os Habitantes da Noite. Entre eles emergia Miro, velho ancião e líder da tribo. Guerreiro destemido e bem humorado, Miro era um bom amigo de Tito. 

Miro recebeu-nos e foi o próprio a desvendar-nos as reentrâncias de Postana. Levou-nos por entre os bairros operários, as grandes alas dedicadas aos rituais de oração até ao coração de Postana, o grande Templo Subterrâneo de Bled. Entre os principais salões do Templo sobressaia a grande biblioteca. 

Miro convidou-nos a sentar e contou-nos parte da história da civilização Bled. Contou-nos que nem sempre os Bled viveram debaixo de terra. Durante décadas foram conhecidos como os Grandes Acumuladores. Foram um povo guerreiro e mercenário que havia conquistado enormes riquezas. Hoje, a realidade era bem diferente. Viviam com o mínimo possível. Eu próprio questionei Miro: 
- Nobre Miro, como é que um povo guerreiro e conquistador se torna no povo dos Habitantes da Noite? 
- Os Bled foram sempre os maiores guerreiros de Lublia. Todas as grandes nações Lublianas recorriam às nossas forças guerreiras para conquistar novos territórios. Éramos um povo mercenário. Mediante o preço certo, estávamos disponíveis para a guerra. Acumulamos grandes riquezas, mas nunca estávamos satisfeitos. Em certa altura, quem ajudamos acabou por se virar contra nós para usufruir da riqueza que havíamos acumulado. Nessa altura, em vez de chegarmos a acordo, mantivemos uma guerra idiota que quase nos levou a extinção. Acabamos por ceder e nos render. Aí, deslocamo-nos para Postana para esconder a nossa desgraça. Com o tempo, o que parecia ter sido a nossa má sina, acabou por nos salvar. -Como assim, meu bom amigo? - Questionei.
- Confundimos muitas vezes enriquecer com acumular. As histórias e memórias que te fazem "mais rico" não foram acumuladas, foram vividas e partilhadas. Felizmente ficamos vivos tempo  suficiente para perceber que caminho fazer. 

A noite continuou com mais histórias sobre os Bled e as suas tradições. Já com a noite como companheira tanto nas grutas como no exterior regressamos a Frankia.