Estava nos meus últimos dias nesta curta estadia em Milénia. Durante esta jornada havia caminhado dezenas de quilómetros pelos detalhes mais recônditos da ilha. Apesar de conhecer Milénia Centrum com muito pormenor, haviam sempre novas formas de perceber e redescobrir a casa que amamos.
Uma desses detalhes por explorar era a aldeia de Povoati, um aglomerado na costa este da ilha habitado por agricultores de árvores de Mile, um fruto muito famoso por estas partes, reconhecido pelas suas propriedades curativas.
Povoati era uma povoação pacata, repleta de concentrações de árvores de Mile nas colinas em seu redor. Não tinha qualquer objetivo quando por aqui me perdi, mas aproveitei para descansar. Ao longe avistei um grupo de locais alegremente a cear. Aproximei-me enquanto peregrino perdido e pedi orientações para o resto da viagem. Aquele que me parecia ser o mais velho do grupo questionou:
- Meu bom amigo, onde pretende chegar?
- Dirijo-me para a Costa Norte, amigo.
- E o que o fez parar em Povoati?
- Seguia caminho pelo trilho do topo nordeste e encontrei Povoati por acaso. Se me poder orientar, agradecia.
- Se pretende chegar à Costa Norte forasteiro, aconselho-o a pernoitar por cá. Vem ai uma grande tempestade, este não é o momento indicado.
Aceitei o conselho. De apenas uma noite, passei lá três dias. Ajudei os agricultores a recolher a última colheita, jantei com as suas famílias e ouvi as suas histórias da ancestral e tradicional colheita dos Miles. Aquele momento havia sido o mais importante de todos os que havia passado nesta curta estadia em Milénia. Revivi o que era viver fora do tempo e em serenidade. Reaprendi a importância do semear, do cuidar para poder colher o fruto que daria as sementes que reiniciariam o ciclo de voltar a plantar, cuidar e colher. Lembrei-me de todos aqueles que conheci que se queixavam da "colheita", sem que alguma vez tivessem semeado. Como em tempos aprendi "semear é opcional, colher é obrigatório". A qualidade do que colhes está na história do que foste capaz de semear. E nessa história temos muito aprender com o agricultores de Povoati.
Os meus dias em Milénia tinham chegado ao fim, era hora de voltar.