Entender a Linguagem do Intocável ... - Diários da Areia - Parte II



Era o meu quarto dia pelo Reino da Areia, Jerash. Como já vos tinha contado, vim conhecer Haxim, Mestres das Artes Secretas da Linguagem do Intocável. Queria conhecer através dos seus conhecimentos os lugares e lendas  deste terra sagrada. Perceber o segredo da Linguagem do Intocável era o grande mistério que queria desvendar.

Hoje seria um dia especial. Teria a oportunidade de viver o Iahd, cerimónia de evocação dos Deuses Antigos e que desvendava, segundo Haxim, a Linguagem do Intocável. 

O Iahd tinha lugar em Dextra, a Cidade Mãe de Jerash , também conhecida como a Cidade do Chamamento Divino. Acontece durante a noite, quando a Lua, em representação da Deusa da Noite, atinge o seu ponto mais alto. 

Dextra é uma cidade esculpida no coração das montanhas. Os seus templos, ruas e vielas são dentro dos maciços montanhosos e nas escarpas que as montanhas permitem que vejam o horizonte. Fica entre desfiladeiros colossais pintados de areia dourada que escorrem por entre paredes imponentes. É tão monumental e desmedida que alguns dizem ter sido erguida pelos Deuses Antigos quando assumiram formas humanas. 

Durante o Iahd, eu, Cleo e Lucy fizemos em silêncio o caminho a pé entre as Portas da Redenção (entrada sagrada de Dextra) e o Templo do Chamamento Divino. Durante o caminho ouvíamos os cânticos muito suaves protagonizados pelas Hilia, Irmãs do Chamamento Divino, congregação de mulheres sacerdotisas que faziam a segurança noturna de Dextra.

Durante a caminhada, os cânticos das Hilia assumiram a forma de chamamento emocional. Por momentos o meu coração pausou, adormeci os sentidos e a minha alma viajou. O meu corpo continuou em movimento, mas a minha alma elevou-se do corpo, ganhou vida própria permitindo que me visse em perspetiva. Naquele momento era como se existissem dois de mim ao mesmo tempo. 

Chegados à entrada do Templo fomos convidados a sentarmo-nos em posição de contemplação, a fechar os olhos e meditar enquanto que os cânticos continuavam, ganhando intensidade gradualmente. Nessa altura senti a minha a alma voltar ao meu corpo. Foi aí que senti a mais incrível das sensações. Percebi que passei para além do tempo. Naquele reflexo temporal almas de todos os momentos passados e presentes ecoavam num mesmo espaço/tempo em forma de consciência coletiva onde a luz e as cores não tinham estrutura e se confundiam com o próprio som. Era uma sensação de conforto e calor que nunca tinha sentido. Era como se todos os sentidos e emoções do mundo fossem uma só. Entendia agora o que era a Linguagem do Intocável. 

Foi um momento que havia estado para além do universo que conhecia mas que revelava ao mesmo tempo todo o universo que a minha alma e o meu cosmos conseguiam ser. 

Nesse dia redigi o seguinte texto no meu diário de viagens: "Quando pensamos em tudo o que cada um de nós é, percebemos que cada um de nós é um universo. Somos todo o universo e todo o universo somos todos nós. Somos o todo num só e cada um de nós faz parte do todo. Foi neste poema milenar que descobri a energia divina que nos liga a todos..."